A fé sabe nadar!

Devocional em Atos 27. 9 – 44
Paulo sabia que o navio sofreria. Deus havia prometido que ninguém se perderia. Mesmo assim, o apóstolo
não ficou parado. Com os homens, ele aliviou o peso da embarcação e os incentivou a comer. E quando o navio
encalhou, com o casco aberto, tudo se desfez. Nada mais restava, senão agarrar-se ao que flutuava. A promessa
divina não é desculpa para a inércia. Ninguém se perde, mas se agarram a qualquer coisa a fim de se salvarem.
“Já que Deus me prometeu um trabalho, nem precisarei estudar.” Deus me prometeu um namorado crente,
temente. Não precisarei conversar com ninguém ou fazer amizades.”
Essas frases ecoam uma fé que espera sem agir. O que é muito estranho, pois o que a fé faz é exatamente mover os
homens.
Veja Paulo neste desastre em alto-mar. Para ele, a fé exige trabalho. E esse trabalho pode significar abrir
mão de coisas — até coisas valiosas — para confiar apenas na promessa de Deus.
Ora, a fé desafia a lei da física – é verdade – mesmo assim, esta lei não desaparece porque o milagre ocorreu.
Então, mesmo sabendo que Deus salvaria a todos naquele navio, Paulo e os homens aliviam a embarcação lançando
todo o peso ao mar. O que pesa, afunda – é a lei. Além disso, Deus prometeu salvar as vidas; nada disse sobre o
navio.
Não seria esse um ensinamento que nem tudo que carregamos merece ser mantido conosco? Kenner explica
que “Lançar fora o grosso da carga é o passo natural nesse ponto; em crises como essa não se faz distinção entre a
carga valiosa e a de pouco valor” (2004, p.419). É sábio saber abandonar aquilo que em nada soma quando o
carregamos. Às vezes, o que pesa é justamente o que nos impede de chegar à terra firme. Sei de mergulhadores
profissionais que tiveram que abandonar cilindro de oxigênio caso quisessem chegar com vida à superfície do
oceano. O aparelho só é importante se ajudar a respirar. Como enfeite, é apenas um peso.
É maravilhoso o modo como Deus nos salva e cuida mediante coisas aparentemente insignificantes. Como
se não bastasse aliviar o navio, os homens ainda se jogam ao mar e se agarram a pedaços de madeira e qualquer
coisa que flutuasse. No fim, os tripulantes não foram salvos pelo navio, mas por objetos flutuantes. Aqueles que, ou
foram jogados fora ou viraram “lixo” depois do navio se partir. Que coisa, não? O ser mais importante ali no mar é
salvo por objetos agora inúteis. Objetos flutuantes – restos de madeiras, pedaços quebrados.
Que natureza é essa do homem que, para se salvar, precisa daquilo que flutua, inerte, sem vida? Um navio
se perde por sua causa. E, as coisas que os mantém vivos agora podem mata-los.
Deus não quer impressionar os homens. Usa objetos sem função alguma. Só quando se torna inútil é que o
navio pode salvar os homens. A salvação veio pelo que sobrou e não por meio do que os homens conservaram
consigo.
Criminosos, agarrados aos destroços, chegam à areia da praia com o mesmo valor que um rei.1 Por que Deus
não salva apenas o seu santo naquele navio? Por que um anjo, o mesmo que Paulo sonhou, não voou até o navio e
tirou o servo de Deus de lá?
Ah… quantos homens já não se salvaram justamente porque o navio encalhou ou afundou? Tiveram que
jogar tudo fora e se agarraram às coisas flutuantes… Levados pelas ondas, deram, “coincidentemente” numa ilha
que lhes foi a salvação. Naufrágios que foram verdadeiros recomeços. Tempestades que os fizeram descobrir o valor
da vida.
A fé não é dispensa de esforços. E não falo aqui nada de obras. Falo das coisas óbvias e ordinárias dessa vida.
Pedaços flutuantes usados por Deus como salvação em horas difíceis. Falo de necessidade de estudar para o
vestibular, caso queira ir para a faculdade. Apertar o cinto, caso queira trocar o carro ou quitar uma dívida… Talvez,
desfazer-se de algo de grande estima, mas que fará com que se sinta em paz, se abrir mão dele. Pode-se vender um
dos carros e pagar um tratamento de saúde. São muitos pesos inúteis que, se lançados ao mar, podem nos salvar
(v.10,11).
Permanecer no navio seria morrer. Mas, a fé do apóstolo incentiva os homens pularem e se agarrarem às
coisas flutuantes. Acredito que foi Deus quem soprou o navio até uma parte rasa (e não soprou porque o navio sem
carga, mais leve, é mais fácil!).
Imagino alguém, entre os 265 náufragos, gritando: “Ei, Paulo! Eu preciso bater braços e pernas?”
“O que você acha?”
Eliandro Cordeiro
Maringá, 14 de nov. 2025
1 KENNER, C.S. Comentário Bíblico: Atos. Belo Horizonte: Atos, 2004, p.420: “Na literatura greco-romana, o escape de um desastre no mar poderia servir de evidência da pureza religiosa de uma pessoa mesmo diante de uma corte.”
“Continue a nadar…
Continue a nadar…
Continue a nadar…”
Dory – “filósofa” da espécie cirurgião-patela azul (sofre de amnésia anterógrada).
