Basta! Mas, eu quero mesmo morrer?

Devocional em 1Reis 19.1-21.
As coisas nem sempre são como as sentimos. Que bom.
“Basta!”, disse o profeta em tom de confissão para o Senhor.
Elias deseja morrer; pede a Deus que o mate. Ele grita “Basta!”. Cansado, sozinho, com medo, identifica a sua
alma com o deserto geográfico de seu país. A caverna é o ponto mais próximo que Elias consegue alcançar da ideia de
morte.
Depois de várias demonstrações de poder, Deus fala ao profeta com uma voz suave, que nos lembra aqueles
dias de ventos calmos(‘cício’ [demamah daqqah] – o hebraico traz exatamente essa descrição), balançando calmamente as folhinhas das árvores (v.12,13): “O que fazes aqui Elias?” Elias parece estar perdido em sua cartografia da alma. Deus lhe pergunta, como fez a Adão, logo depois do primeiro pecado: “Adão, onde estás?”
Evidentemente que Deus sabia onde Adão e Elias haviam se escondido. Mas, a pergunta retórica informa que
esses homens não sabiam. Elias sabia realmente o que fazia no fundo da caverna? Imagino o quão maravilhoso tenha
sido àquele homem descobrir que o Deus que estoura pedras como uma dinamite, também sabe soprar ‘dente- deleão’.
O homem da caverna, então, explica a Deus a sua solidão e o caos em que o mundo se encontra. Conta-lhe a
sua fidelidade e, por isso, a triste solidão: Não há mais o que fazer. “O mundo está perdido mesmo, não é, Deus?”
Amorosamente, o poderoso Deus ouve as fraquezas de Elias. Quanta delicadeza teve Tiago, o apóstolo, em sua
interpretação da biografia de Elias (Tg 5.17). O profeta sujeito às paixões (‘patos’) era como nós. Ou seja, tinha a mesma natureza.
É como se Tiago dissesse-nos: “Tudo bem dizer ‘basta!’ às vezes. Pode orar mesmo assim” (cf. At 14.5).
Aquele que nos fez entende que este homem precisa se situar enntrou na caverna com Elias, (“o que fazes
AQUI, Elias?”) ao mesmo tempo em que o chama para fora (v.11). Este homem precisa elaborar onde estão pessoas, as coisas e onde ele mesmo. Ele me lembra um homem procurando um par de meias no guarda-roupa de 12 portas. O
profeta vê o seu mundo com as peças todas fora do lugar.
Ao responder a Deus, no diálogo com a poderosa voz suave, de repente, Elias está à entrada da caverna. Agora,
com o espírito desembotado, Deus mostra ao homem como de fato o mundo está.
Os sentimentos e as emoções enganaram o homem de fé. As coisas não são como vê ou sente. As coisas estão
como Deus as vê e diz que estão. Deus traz verdades ao profeta, respondendo-lhe à queixa: “Elias, enquanto você lutava, outros sete mil servos meus também “não dobraram os joelhos a Baal” (v.18). Eu separava Eliseu para te substituir (v.16,19). Eu movia os corações de Hasael, Jeú. Você só vê o comportamento, Elias. Eu mudo corações.”
Não é irônico que o homem que pediu a Deus a morte é, justamente, ao lado de Enoque, aquele que nunca a
viu? Elias não queria morrer- queria fugir daquele momento. Se quisesse a morte, falaria a Deus que fugiu de Jezabel
porque esta procurava matar-lhe (v. 10,14)?
Elias não sabia ao certo o que queria. O que Elias queria é viver. E Deus o fez viver eternamente – porém, sem
Jezabel, dores, medos. Deus leva o profeta numa carruagem de fogo e nunca mais foi visto (2 Rs 2.9-14). Deus sempre faz mais do que nós conseguimos prever.
Elias gritou “basta!”, e Deus não lhe gritou de volta “Fraco!” Deus o chamou com suavidade e o levou aos céus
com o furor de um Deus amante do homem.
Se você está como Elias, quase dizendo “Basta!” ou “Só eu…”, leia estes cinco princípios básicos àqueles que
querem desistir de tudo.
1 A realidade pode ser muito diferente de como as vemos. Afastar-se um pouquinho da agitação é prudente.
Porém, fugir é algo diferente. Afaste-se um pouco para ver os sete mil profetas – não para ver os próprios pés.
2 Sentimentos não são mapas confiáveis. Embora emoções e sentimentos sejam importantes instrumentos de
Deus a fim de colocar-nos em relação com o mundo externo e com os outros não são infalíveis como a fé é. Cuidado
para não confundir a fé com o “Eu sinto”, “O meu coração falou…”.
3 Desconfie sempre da tua própria narrativa histórica. Ore e espere pela explicação/interpretação de Deus. Deus
vê tudo melhor. O caso de Elias, tudo se resolveu com apenas um “Vai, volta ao teu caminho …. Partiu, pois, Elias …”
(15,19).
4 Não se acostume com Deus. Deus não é exibicionista. Você o poderá ver em temporais, raios, trovões. Mas,
também, nos “ventinhos” da vida. “Aslam não é um gatinho fofo – é um leão indomável”, como disse CS Lewis.
5 Uma verdade libertadora: O mundo funciona sem nós, mas nunca sem Deus. O que eu não consigo fazer não
torna as coisas perdidas – só eu, às vezes! Não é porque você não conseguiu fazer que tudo está perdido. Descanse.
Eliandro Cordeiro
Maringá, 27 de set, 2025.
A gente deveria só morrer de tanto viver!
