“Daquele dia em diante, Saul não via a Davi com bons olhos. No dia seguinte, um espírito, da parte de Deus, se apossou de Saul, que teve uma crise de raiva em casa; e Davi, como nos outros dias, dedilhava a harpa; Saul, porém, trazia na mão uma lança. Que arrojou, dizendo: encravarei a Davi na parede. Porém Davi se desviou dele por duas vezes” (1Sm.18.9-11).
O louvor é uma poderosa bênção, mas não faz mágica. O louvor não libertou a alma do rei Saul. Saul teve com a música momentos de alívio, mas nunca a libertação permanente, como aqueles que ouvem um hino desejando a presença de Deus.
Cantar louvores o dia inteiro dentro de casa pode ter pouco ou nenhum resultado se a inveja ou a raiva não forem expulsas do coração de quem canta. Se os ouvidos estiverem sempre abertos para o ritmo e toques das cordas, mas os olhos inchados de raiva e a mão não descansar a lança, não haverá louvor que alcance o coração.
Enquanto Saul ouvia as notas, o espaço e tempo das canções de Davi, as suas mãos não descansavam. Estavam agarradas à lança que em breve seriam lançadas rumo ao moço harpista. Saul estava pronto a ouvir a música, negociar paz com os demônios de sua alma, mas não abria mão da lança. Acreditava que o seu trono dependia dela.
Saul e Davi voltam para casa depois da inesquecível vitória deste menino. O gigante Golias caiu na batalha quando um menino (Davi), tacou-lhe uma pedra, dessas qualquer, em sua enorme testa.
O autor do livro de 1 Samuel nunca quis que os olhos de seus leitores se voltassem para Davi, mas para o fato de que, Deus era o Rei em Israel e pelejava as suas guerras. Ora, o que poderia fazer um menino sem experiência alguma, com uma pedra, entre homens experientes? Francamente? Precisamos ler essa história melhor a fim de entendermos a real intensão do Seu Autor. A personagem dessa história não é Davi; é Deus! E que grande humilhação para o poderoso gigante cair por causa de uma pedra! Deus realmente usa quem e o que quer (1Co.1.27-29)!
Mas fato é que Saul também não compreendeu muito bem o que havia ocorrido no campo de batalha. Assim como as mulheres que cantarolavam a vitória de Davi, o rei atribuiu o grande feito ao moço. Saul não interpretou muito bem a vitória como o fez o seu filho Jonatas: “Arriscando ele a vida, feriu os filisteus e efetuou o Senhor grande livramento a todo o Israel […]” (1Sm.19.5).
Em casa, a história toma dimensões desproporcionais aos olhos do rei. Saul não ouvia mais as músicas que Davi tocava. Ele só ouvia a música daquelas mulheres: “Saul feriu milhares, porém Davi, os seus dez milhares […]” (v.7). Desde então, Saul olha a vida diferente. A amizade com o moço torna-se em inimizade, seus olhos tiram toda a beleza da vida e assumem a função auditiva de seu coração, isto é, tudo o quanto ouve Davi dedilhar é só raiva e inveja! “Daquele dia em diante, Saul não via a Davi com bons olhos” (v.9).
Bom, o que segue depois que os olhos ocupam o lugar dos ouvidos é demoníaco. No dia seguinte (v.10), os demônios, existentes no porão do coração invejoso de Saul, sobem para a sala de festas. Enquanto Davi toca a harpa, eles dançam na mente do rei.
Saul não inveja a presença de Deus na vida de Davi; ele inveja a sua fama, o poder.
Doravante, Saul ouve as canções sem largar a lança (Ele ouve as notas musicais, mas sem meditar nas letras?). Era de pouca valia ouvir a harpa, quando tudo o quanto o rei queria não era Aquele que conduzia Davi ao sucesso, mas o sucesso de Davi sem a presença de Deus (v.14,15).
A presença de Deus na vida de Davi assumiu, para Saul, apenas um aspecto político que apontava para o futuro sucessor do trono em Israel (1Sm.20.30-33). Ironicamente, Davi tocava a harpa quando Saul tentou matá-lo. Portanto, havia música. O louvor enchia o local, só não chegou ao salão de festas onde estavam os demônios!
O louvor é poderoso, mas não faz mágica! Não se esqueça que, enquanto Davi dedilhava a harpa, os demônios de Saul dançavam a canção em seu salão de festas (o coração)! De nada adianta cantar louvores quando o coração está cheio de inveja e a mão nunca descansa a lança, sob o medo iminente de perder o domínio (1Sm.18.6-16). Os demônios de Saul pareciam conhecer todas as músicas de Davi.
Portanto, antes de você dizer que o louvor liberta, preste mais atenção no que canta e no que sente enquanto canta. Há demônios acostumados à harpa de Davi? Há inveja ou raiva porque o outro tem sucesso na vida, enquanto você parece não sair do lugar? Já não percebe mais que é mais importante a presença de Deus do que o sucesso na vida sem Ele? Acredita que está mais seguro agarrado a uma lança do que agarrar-se às mãos de Deus? Justifica os seus acessos de raiva ao seu temperamento colérico ou sanguíneo (Ef.4.2-6,31)?
Se você disse sim para muitas dessas perguntas, é sinal de que já se acostumou com os louvores ou com as músicas que ouve. Suas letras e melodias já não mais fazem sentido para você (Embora você goste de cantá-las). O pior é que você não se acostumou sozinho com elas: tem bastante “gente” dançando em seu salão de festas enquanto você ouve o dedilhar da harpa.
Professor Eliandro da Costa Cordeiro, Maringá-PR