Mente e coração: vazios e cheios.
“Não andeis ansiosos de coisa alguma […]. E a paz de Deus que excede todo o entendimento, guardará o vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus. Finalmente, irmãos, tudo o que é puro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, sede isso o que ocupe o vosso pensamento.” (Fp 4.6, 7-8).
Os siameses
A mente não descansa e o coração já perdeu o ritmo? Milhares e confusos pensamentos poluem a tua mente e te fazem doer o corpo? O coração dispara aparentemente sem motivo?
Ora, a mente e o coração não são tão distante assim um do outro, como se fossem inimigos. O coração pensa e a mente sente, sabia (At 16.14)? Se ambos não são a mesma coisa, são, no mínimo, irmãos siameses.
Um tiro certeiro do diabo na mente para o coração tanto quanto um afeto mal resolvido desprende um coágulo e faz a mente morrer (Pv 4.23; 23.7; Mt 15.19; Jo 13.2,27)!
Para Paulo, ambos podem muito bem ser intercambiáveis. Ambos, mente e coração devem estar protegidos. Há um aqueduto escondido, ligando os dois, com águas sujas, porém, férteis, e sem a presença da Luz, (contrariando a “biologia da alma”) permitem surgir pensamentos e afetos daninhos. Os tais criam raízes profundas e assumem todo o solo onde Cristo plantou as suas virtudes (Lc 8.12ss; Gl 5.22,23).
Deste modo, o Apóstolo dos Gentios afirma que, tão importante quanto deixar mente e coração limpos é enchê-los de virtudes honrosas, evitando o vazio da alma (Mt 12.43-45). Pois, de nada adianta esvaziá-los se assim permanecerão. Eles não existem para ficar vazios. Não são funcionais nem importantes assim (Cl 3.1-5).
Três conselhos práticos:
- Mude hábitos, gêneros de filmes ou músicas. Faça amizades saudáveis. Leia livros edificantes. Mude a oração! Talvez devesse refletir mais nas emoções e pensamentos que te passam ligeiros na mente enquanto ora. Organize-os, reflita ou os confesse. Perceba se ao orar pelos teus inimigos a mente não derrama águas do aqueduto sombrio no coração, fazendo crescer a amargura (Mt 5.23,24; Hb 12.15).
- Arraste aos pés de Cristo cada “desejozinho e pensamentinho bestas” que podem se ocultar no cantinho da lembrança. Ponha no meio do campo de batalha o teu doce coração (usei ironia!). Ele talvez travista o ódio em forma de justiça (Lc 18.9-14). Quebre, então, o seu conteúdo aos pés de Cristo (Mc 14. 3-9). Ele não te serve de enfeite (Êx 33. 4-6; Is 3.18-24). Mas Cristo sabe como lidar com o cheiro da mente e do coração mal-curados (Jr 30.17).
- Cada pequeno espaço vazio da mente e do coração devem ser preenchidos com os elementos ordenados pelo apóstolo (cf Fp.4.8). Não se trata de algumas coisinhas deixadas dentro dos muros. Paulo diz “tudo”. Como você percebe que o que te ocupa a mente e o coração é maléfico à alma? Como sabe se o conteúdo é agradável a Deus, portanto, a ti também? O que é colocado no vazio dos pensamentos impuros ou dos afetos infames? Não suportamos o vazio!!
Ansiedade: a inimiga de dentro das fortificações da alma
Sabemos que a ansiedade pode brotar da tola ideia de que controlamos todas as coisas. Acreditamos que somos capazes, sozinhos, de vigiar todos os pensamentos e sentimentos inimigos, lá do “alto do muro”, onde a nossa inteligência senta vigilante (Mt 6.27).
Na verdade, é só em Cristo que encontramos a paz necessária para a mente e o coração. Sem Ele, somos atingidos num ou noutro. Não somos poderosos! A ansiedade é também pensamentos e sentimentos deturpadores da realidade externa. É uma projeção realizada pela situação interna da mente e do coração (Sl 94.19a).
Preocupamo-nos tanto em impedir que “coisas” nos incomodem a mente e o coração que nos esquecemos que o vazio, o ‘salão’ desocupado, é tão perigoso quanto a flecha inflamada por qualquer combustível maligno lançado do lado de fora dos muros da alma! Nosso coração é inflamável e a mente inflamente.
Não basta evitar que as flechas inimigas nos atinjam do lado de dentro das fortificações. Deste lado devemos ter cada centímetro quadrado ocupado. Ah! Mas nos é mais fácil ocuparmos Antares do que um centímetro do nosso coração (Pv 16.32; 18.19).
Mudamos o gene do grão de soja, fortalecendo-o contra pragas futuras, mas nos é impossível invadir um alelo[1] dos nossos maus pensamentos antes que completem a cadeia genética pecaminosa. Nossas armas são fracas contra nós mesmos, e nossa arte da guerra é brincadeira pueril perto do grande mal que fazemos contra nós mesmos. Somos capazes de nos odiarmos chamando isso de amor próprio (Rm 7.19).
Cristo, bombas e estalinhos
Fiz com que você se sentisse vulnerável? Não é o que Paulo faz com os irmãos que receberam esta santa carta? Ele sabe que a ansiedade é uma arma poderosa contra a mente e o coração. Sabe que a ansiedade transforma “coisa alguma” numa Tsar Bomb e que o homem pouco pode contra aquela. Contudo, Cristo a transforma em estalinho de festa junina. O depressivo Spurgeon descobriu que “a oração é o antídoto para toda a ansiedade.”
Está ansioso? Já sabe o que fazer, né? Vai ouvir estalinhos.
Eliandro Cordeiro
Maringá, 9 de agosto, 2024.
[1] Os genes alelos são aqueles que ocupam o mesmo lócus em cromossomos homólogos e estão envolvidos na determinação de um mesmo caráter.